Neurodiversidade ganha espaço, mas inclusão segue limitada nas empresas

04 de maio de 2023

Tempo estimado de leitura: 3 minutos

A ascensão da pauta ESG, sigla para gestão socioambiental e governança, tem levado a um crescimento de políticas de inclusão nas empresas brasileiras. No entanto, a neurodiversidade, que engloba profissionais autistas ou com outras neurodivergências, ainda é pouco debatida no ambiente corporativo.

“É um tema que, no Brasil, está atrasado. A gente já deveria estar falando sobre a neurodiversidade há algum tempo”, afirma Christine da Silva Schröeder, professora assistente na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e profissional neurodivergente.

O que é a neurodiversidade?

 

O conceito de “neurodiversidade”, criado pela socióloga australiana Judy Singer, é usado para definir a variação neurocognitiva natural presente na sociedade. Já o termo “neurodivergente” é usado para definir uma pessoa cujo funcionamento mental diverge dos padrões ou expectativas.

“É uma diferença entre os cérebros humanos. Não é necessariamente uma deficiência, é apenas uma característica”, explica Christine.

Dentro dessa grande variabilidade neurológica, existem condições que são mais próximas dos padrões e as que são atípicas — como  autismo (TEA), dislexia, dispraxia, TDAH (déficit de atenção com hiperatividade), TOC (espectro obsessivo compulsivo) e síndrome de Tourette. 

Neurodiversidade no ambiente de trabalho

 

Nas empresas, essa multiplicidade é valiosa: “Investir na neurodiversidade é investir na construção de uma organização mais preparada para o diálogo, cooperação, inovação e criatividade”, afirma Fernando Mantovani, diretor-geral da companhia de recursos humanos Robert Half, em seu artigo no LinkedIn.

Segundo Christine, os autistas se tornaram protagonistas da discussão sobre este tema nas empresas. Porém, mesmo para eles, os índices de empregabilidade ainda são baixos. Estima-se que somente 15% dos adultos do grupo têm empregos, apesar de serem contemplados pela Lei de Cotas (Lei nº 8.213/91). Essa norma define uma porcentagem mínima de cargos reservados para PCDs (pessoas com deficiência) de acordo com o tamanho da companhia.

A resistência às contratações de profissionais neurodivergentes se deve, principalmente, à falta de preparação das empresas para receber o grupo. Segundo Jéssica Simões, cofundadora da assessoria de marketing Aster e profissional com TDAH, a falta de conhecimento sobre neurodiversidade é uma das principais dificuldades das pessoas neurodivergentes no mercado de trabalho.

“Profissionais com TDAH, na maioria das vezes, são avaliados como pessoas preguiçosas, que não respeitam regras e prazos de entregas, que têm dificuldade com processos e hierarquias. Mas, na verdade, a nossa maneira de trabalhar e pensar é apenas diferente.” 

Praticando a inclusão

 

Os aspectos técnicos, emocionais e sociais dessas pessoas devem ser levados em conta no momento de recrutamento e seleção de candidatos. Processos seletivos com as tradicionais dinâmicas em grupos tendem a favorecer pessoas falantes e sociáveis, o que pode ser um desafio para indivíduos neurodivergentes. Mapear e suprir as necessidades de cada candidato com dinâmicas individuais e menos exposição torna a admissão mais acolhedora.

Após a contratação, oferecer recursos e suporte adequados aos desafios adicionais que o funcionário pode enfrentar também é uma forma de apoiar a neurodiversidade.

“Cada pessoa vai exigir uma adaptação diferente”, explica Christine. “O que funciona para pessoas autistas, por exemplo, pode não funcionar bem para pessoas com alguma outra característica.”

A pesquisadora também sugere a revisão de benefícios corporativos e a oferta de um plano de saúde com clínicas que possuam experiência no atendimento de neurodivergentes.

Mudança de paradigma

 

Para a pesquisadora, o investimento em conscientização e acolhimento é essencial para a virada de chave sobre a neurodiversidade no mundo corporativo. O acesso a informações corretas — por meio de workshops e palestras — ajuda a quebrar estigmas sobre as pessoas neurodivergentes, além de preparar as equipes para incluir novos funcionários.

Já para as lideranças, a pesquisadora recomenda treinamentos mais aprofundados, que os capacitem para compreender as características de cada funcionário e, assim, aprimorem suas habilidades na gestão de equipes. No entanto, embora essas iniciativas sejam importantes, Jéssica ressalta a importância de que “sejam complementadas por outras ações para garantir que a inclusão ocorra em todos os níveis e em todas as áreas da organização”. 

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